terça-feira, 30 de agosto de 2011

GUARDA

Guarda, poeta, bem guardada a dor,
A mágoa negra, a mágoa que te oprima,
Pois não há mágoa de amor que redima
No peito sofredor, paixão e amor.

Esconde essa paixão como uma flor
Que em dorida capela se deprima...
E que nunca, sequer, jamais a exprima
Um descuido, uma frase ou um rubor!

Guarda nessa capela que é teu peito,
Num lugar bem discreto, mas perfeito,
Onde em paixão tu sofres mágoa atroz.

Mas não te culpes dessa besta mágoa,
Que teus olhos não vertam dessa água
Que nos perturba. Nos embarga a voz!

SEM ESCUDO

Quando um dia vos deixar,
No meu peito as mãos cruzadas,
Nem sabem quantas nortadas
Eu consegui enfrentar!

E nessas duras jornadas,
Não, ninguém me viu chorar,
Nem lágrimas a brotar
Quentes e desbragadas.

Viam, talvez, um sorriso,
Tão difícil, impreciso,
Que nem já se lembram dele.

Eu lutava sem escudo,
De peito aberto, desnudo...
...Mas senti o mal na pele!



HORAS SÓS

Aqui tens, aqui vão meus versos tristes
Feitos em horas sós, em horas mortas,
Quando à tardinha todos fecham portas
E com o pensamento me atingistes.

E lá fora de casa, lá nas hortas,
Vão cantando as cigarras que não vistes,
Mas que existem como também existes,
Acordando memórias tão absortas.

Mas tu andas, indiferente e linda,
Zombando da tristeza enorme, infinda,
Tão soberba, sorrindo com prazer...

E eu, pobre mendigo de carinho,
Sou como a ave quando faz o ninho
E procurar a outra ave quer.




VIBRAÇÃO

Se sentires um afecto
Entrando na tua alma,
Sossega, mantém a calma,
Porque é de alguém teu dilecto.

O teu nervosismo acalma
E ouve, que sou discreto:
- Repara no meu aspecto,
Que a tristeza leva a palma...

Sente a doce inquietação
Que é da minha vibração,
Desta paixão que arrebata!

Minha fome, meu desejo,
Minha vontade de um beijo
Que persegue e desacata!


VIBRAÇÃO

Se sentires um afecto
Entrando na tua alma,
Sossega, mantém a calma,
Porque é de alguém teu dilecto.

O teu nervosismo acalma
E ouve, que sou discreto:
- Repara no meu aspecto,
Que a tristeza leva a palma...

Sente a doce inquietação
Que é da minha vibração,
Desta paixão que arrebata!

Minha fome, meu desejo,
Minha vontade de um beijo
Que persegue e desacata!


OLHAI-VOS...

Agora temos os cabelos brancos,
Usamos óculos de ver ao perto,
À nossa volta, temos um deserto
E nos jardins os solitários bancos...

Encontrar um amigo é menos certo,
Andamos com bengala, estamos mancos,
Nossos chinelos pesam quais tamancos,
Enfim, vivemos quase em desconserto!

Olhamos as mulheres com cobiça,
É esta magra, a outra mais roliça,
Uma loira ou aquela bem morena!

Vemos nos homens uns esbeltos pares,
Insistimos nos lânguidos olhares...
Uns e outras, olhai-vos. Tenham pena.



RÉSTEA

Na nossa idade, senhora,
São as saudades que pesam,
Os sentimentos que prezam
Uma amizade de outrora!

As recordações que lesam
Qualquer alma sofredora,
Como esta sofre agora
Males que não nos desprezam...

Na nossa idade, formosa
Dos bons tempos cor-de-rosa,
Nesta idade, que nos resta?

As lembranças do melhor,
Aquela réstea de amor
Que ainda hoje molesta!

NÃO É DE PEDRA

Já não sei o que dizer
Da minha saudade imensa!
Se tenho força que a vença
Se ela está sempre a crescer...

Chego a pensar em doença,
Uma maleita qualquer!
Mas, se é também um prazer,
Afinal é recompensa...

Vivo nesta ambiguidade,
Neste masoquismo atroz
Só por culpa da saudade!

Esta mágoa que em mim medra,
Um sentimento me impôs.
Coração... não é de pedra...

SEM DESCANSO

Se sentes no coração
Um mais forte batimento,
Sossega, que é um sentimento
Em sua plena erupção!

Dá-lhe o teu consentimento,
Que não sejas negação
Que se opõe à intenção,
Em teu próprio detrimento.

Teu coração, sem descanso,
Num imparável balanço,
Como frenética abelha,

Se soubesse quem escreve
Derretia a fria neve
E a faria vermelha!

FEITIÇOS

Tanto quero dar um beijo
À minha Musa “Delícia”...
Porque o beijo é uma carícia,
A carícia do desejo!

Como o desejo é malícia,
A malícia que eu almejo,
Almejo agora o ensejo
De uma ocasião propícia!

Pensamentos insubmissos
São dulçorosos feitiços
Que recordam o teu vulto.

Agora, sem poder mais,
Suspirando e dando ais
Vivo em constante tumulto!

COMO PROMETI

Venho falar-te de amor
Como te prometi...
Falar de amor... é falar de ti,
Do olhar acolhedor!

E já uma vez eu senti
Nesse olhar, doce calor...
Um olhar enganador?
Então, por que o mereci?

És a rainha das Musas
E, certo, nunca recusas
Dar-me sempre inspiração

Porque bem preciso disso
Como no pior cortiço
A abelha mestra o zangão...

FALAR-TE DE AMOR

Só vou falar-te de amor,
Esse sentimento belo
E que tão bom é vivê-lo,
Sentir seu doce sabor...

Às vezes um pesadelo
Elevado ao grau maior!
Mas porquê, meu Deus, Senhor,
Paira sempre esse cutelo?

Só de amor eu vou falar-te
Se tanto ajudar a arte
E tu, Musa, me inspirares...

Amor é nada ou é tudo
E juro que fico mudo
Se tu, Musa, te calares!

MIGALHA

A camélia perfumada
Lembra-me a tua figura:
Essa face delicada
Toda cheia de candura!

Minha alma apaixonada,
Sempre na tua procura,
Encontra a porta cerrada
Sem ferrolho ou fechadura...

Penando sem esperança,
Sou como aquela criança
Desconhecida, sem nome,

Que anda de mão estendida
Para a migalha perdida
Que possa matar-lhe a fome!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Eu sinto uma dor tão doce

Eu sinto uma dor tão doce,
Parece contradição,
Como se intenso nevão
A tórrida praia fosse...

Mas é pura sugestão
Na inquietação agridoce;
Um passarinho me trouxe
A agradável sensação!


E vai doendo a ferida,
A dor quase apetecida
Que me lembra e me consola.

O tempo refina a idade,
Esta refina a saudade,
Cada uma nos imola...

Artificial

Olha como sou feio, desastrado,
Bem cuidado, é certo, mas banal!
Como qualquer alguém também mortal
Bate-me um coração, talvez cansado,
Não frio, como estátua em pedestal.
Com esta má figura e acanhado
E com o coração batendo mal,
A alma triste em negro gradual,
Estou sózinho, estou abandonado,
Como náufrago em pleno temporal!
E ando por aí, desconfiado,
Olhando para todos, no local
Onde passo. De modo casual
Vou caminhando em passo descuidado
Metido em pensamentos, afinal.
Como um autómato, desnorteado,
Absorto, alheio a tudo, informal
Sigo pelo caminho em diagonal,
Arrastando o meu corpo derreado
Como palhaço em pleno carnaval.

. . .

Que pesadelo! Estou mortificado!
Não sou assim, nem este visual
Descrito deste modo original
É meu, não corresponde, foi forjado,
É qualquer coisa de artificial...

Pálpebra

Fechou-se a pálpebra. Acabou o dia!
As aves, em ruidosa sinfonia,
Acomodam-se, inquietas, no arvoredo...
Dentro da noite, escura como breu,
As estrelas cintilam lá no céu
E começaram a brilhar mais cedo.


Silêncio. Um silêncio tão absoluto,
Que nem vento nem folha, nada escuto!
Só eu, na companhia das estrelas.
E naquele momento, nesse instante,
Vaidoso me senti e importante
Porque era apenas eu, no meio delas.


E reparo na Estrela da Manhã...
Lá longe bem escuto coaxar a rã
Em algazarra divertida, claro!
Um cão ladra, convicto, não sei onde
E logo após um outro responde
Num aceso diálogo, não raro.


E descerra-se a pálpebra. De novo
A luz do Sol desperta, anima o povo
Com pujança e fulgor sem paralelo.
Senso impossível eu localizá-lo,
Canta um afoito, fulgurante galo,
Autoritário rei no seu castelo!

A Natureza chora

A Natureza já chora...
Para nós é uma alegria
Pois há muito não chovia
Tanto como chove agora.

Tão cinzento está o dia,
O melhor é ir embora
E vamos lá para fora
Se vier uma alvazia.

Anda-se desprevenido,
O povo anda esquecido
De Invernos anteriores.

Sem conhecerem a lua
Apanham chuva na rua!
Do céu ouvem-se rumores...

Saudades

A tua imagem na memória trago
E sinto um terno, quente, doce afago
Nesta lembrança calma que é uma aurora.
Andando todo o dia porta fora,
Defronto, sem te ver na realidade,
Imenso, um longo dia de saudade,
Saudoso como a ave do seu ninho,
Correndo lento, tão devagarinho,
Que os caminhos desertos já decalco
Nesta paisagem verde que é meu palco!
Quando oiço a ruidosa passarada
Na sua sinfonia baralhada,
Enfrento então a noite já caindo,
Voltando a casa e ver teu rosto lindo
Na noite, aquela luz que me alumia
E faz dela aurora, claro dia!

Retrato de Santa

Quando tu cantas, tua voz me encanta
Entoando singelas melodias...
E como eu gosto dos amenos dias
Em que me chega o eco de quem canta!

E as celestes pupilas luzidias,
Tão dignas do retrato de una Santa,
Suspendem-me as palavras na garganta,
Sinto arrepios, ficam as mãos frias.

E as loiras cores das formosas tranças
Brilhando, matinais, em ondas mansas
Enroladas ao teu pescoço nu,

São para mim volúpia e tentação,
Fornalha intensa no meu coração
Que eu tenho pena que não sintas tu...

Tristes Emoções

Eu vos digo, vos digo nesta hora
Das guerras e da fome, da doença,
Das misérias que grassam mundo fora,
A cada esquina marcam a presença!

E digo-vos aqui que a mesma aurora
Que aquece, que alumia, tão intensa,
Alumia quem ri, também quem chora,
Aquele que mais perde ou o que vença...

Alumia o mais leve passarinho,
Dos que andam por aqui, que fazem ninho
Nas densas sebes verdes do jardim;

Que cantam, descuidados, as canções
Que me despertam tristes emoções
E me conduzem a pensar assim.

Capital

Sinto por ti uma atracção vermelha,
Uma força invisível, poderosa,
Como o perfume fino de uma rosa
E a canseira diabólica da abelha.

É paixão doentia, perigosa!
Mas, como tu sabes, antiga, velha,
Só realizável, como se aconselha,
Em atmosfera quente e odorosa.

Mas toma nota, o tempo passa, corre,
Todos os dias nasce e todos morre!
Como o futuro, enfim, é virtual...

O tempo foge e foge bem depressa,
Quer queiramos quer não, não mais regressa!
Não percas tempo. O tempo é capital.

Passado, presente e futuro

Temos passado. Existe na memória.

Presente, o dia de hoje, o actual.

Cada dia vivido é uma vitória,

Menos um no futuro virtual !

Minha Solidão

Quando nosso olhar se troca
Boa sensação imprime:
Faz crescer água na boca
E subir tensão sublime.


Tua presença é tão pouca
Que meu coração oprime,
Fazendo-me a vida louca
Que o meu rosto assim exprime.


Minha solidão é tanta
Que a ninguém decerto espanta
A tristeza que me habita.


O dia acaba depressa
E a noite chega e começa
Um fogo em mim, que crepita...

Não é paixão

Eu não encontro uma rima,
Uma expressão inspirada,
Essa palavra que exprima
A paixão desesperada!

Seria uma obra-prima
Para sempre apreciada!
A que redime e sublima
A alma despedaçada.

O pensamento me leva
Pela aurora. pela treva,
Nas paragens do horror.

Não encontro essa palavra,
Mas o fogo ainda lavra...
Não é paixão, mas amor.

Apelo

Sinto um apelo, um intento
Para me encontrar contigo...
É desejo que persigo
Concretizar esse evento!

Quero ser porto de abrigo
Quer da chuva, quer do vento,
Responder ao chamamento,
Ser teu herói no perigo!

E como compensação
Não mais que a tua atenção
Cá de mim não se distraía.

Mas a prenda maravilha...
...Era aquilo que fervilha
Debaixo da tua saia...

Eternidade

A Eternidade está batendo-me na porta
E não sei como então resisto ao chamamento,
Tão intenso, tão forte e frio como o vento
Que sopra duro, rijo, atroz! Quase que corta!

É luta desigual, mas tenho algum alento.
Porém a Vida existe, ainda não é morta...
Lutar, neste momento, é o que tudo me importa,
Embora saiba ser em vão o meu intento!

Obscura Eternidade que se não conhece,
Manto negro cobrindo aquele que falece,
Universo infinito onde pairam as almas!

Vislumbro a porta aberta para eu entrar,
Almas voam ali e andam a pairar...
Fora, na despedida, lágrimas e... palmas!

Assombro

Entras na Igreja... Um assombro!
Meu olhar a ti se prende.
Não sei se Cristo se ofende
Por te espreitar pelo ombro...

Também tenho meu Calvário,
Inóspito altar de dor
Onde expio, solitário,
As perversões do amor.

E no lenho que carrego,
Mas que vai continuar,
Vais tu, sem martelo ou prego,
Nele me crucificar!

Do ponto mais elevado

Subi ao alto do monte,
Onde cheguei transpirado.
Descansei um bom bocado,
Bebi água numa fonte.

Do ponto mais elevado
Alarga-se o horizonte:
Em baixo, mesmo defronte,
Olho e fico extasiado!

Correm prateados rios
Lembrando ofídeos esguios
Serpenteando indolentes...

E oiço os pardais palrar,
Andorinhas a trinfar
E mil grilos estridentes...

Não vou perder...

Vou escrever-te um poema,
Um canto só para ti...
Não digas que o escrevi,
Faz do sigilo teu emblema.

Gostava de estar aí,
Em alegria suprema!
Com tristeza, qual diadema,
Não posso sair daqui...

Penso em teus olhos tão belos,
No negro desses cabelos,
No encantador sorriso.

E Cupido, em lava ardente,
Impele-me para a frente...
Não vou perder o juízo!

Opiniões

Falam pelos cotovelos
Com risinhos amarelos,
Elas, sobre o desempenho:
- Valorizo o comprimento;
- Eu, com pouco me contento;
- Para mim, serve a que tenho.

Três opiniões distintas
Nestas frases tão sucintas
Que a sofreguidão consagra!
Um ponto em comum, porém:
Cada qual tem a que tem,
Grande ou não, grossa ou magra...

E estas moças tão boas
São autênticas leoas,
Insaciáveis sem nexo!
Com esposo ou sem esposo,
O que elas querem é gozo,
Sempre, sempre, sempre... sexo!

Passarada

Oiço lá fora um melro assobiar
A melodia ímpar dele, autor,
Em fantástica afinação, vulgar
Nos cantos invulgares do cantor!

Ao longe um rouxinol então responde
Em requebros magníficos, de encanto;
Mas não se sabe o galho em que se esconde,
Para, cantando, estar vertendo pranto.

Salta o pisco. Espontânea defesa,
Lá do alto, lá onde não se vè,
Cantando e assobiando com fineza
Não se entendendo bem, também, o quê!

Vem então o pardal irreverente,
Como palhaço após os trapezistas!
Acabou-se o concerto abruptamente
E deu-se a retirada dos artistas...

Uma Estrela

Maria, que desespero
Eu sinto quando desejo
Abraçar-te e dar-te um beijo,
Mais ainda, sou sincero...

Solto-me e feliz vicejo
E aqui mesmo te assevero,
Não domino nem tempero
Este sonho em que voejo.

Uma estrela no céu brilha
E, vendo essa maravilha,
Comparo-a com teu rosto!

Esse brilho timoneiro
Indicando-me o carreiro,
O caminho que mais gosto...

Serenata

Acorda e vem à janela
Que a Lua com seu palor
Desmaia na face bela
De quem canto com amor.

Ouve a minha serenata
Que com esta voz te canto...
Ah! Se a saudade não mata,
Não morrendo sofro tanto!

E anseio em teus braços
Desfrutar minha paixão,
Que os lentos, cansados passos,
Vão em tua direcção.

Acorda, sim. Vem serena
Nesta calma madrugada!
A voz canta, a mão acena
Com a alma angustiada.

Vem, espero a sentença,
O teu decisivo gesto:
Estou com pena suspensa,
A decisão não protesto!

Não protesto, mas reclamo
E gritarei para a Lua
Que te adoro, que te amo
E ajoelho-me na rua!

Sem disfarce

Não sei se o que vou dizer
Será assim que se diz:
- Enquanto não te tiver
Nunca mais serei feliz!

Se o Destino não quiser
Aquilo que eu sempre quis,
Não vale a pena viver
Sem fazer o que não fiz...

Mas, enfim, eu não desisto
E quero que saibas isto,
Entre nós e sem disfarce.

O meu destino é este,
Todo de negro se veste...
... Mas de rosa quer pintar-se.